Tratado: “Das Excellencias do Alecrim, e sua qualidade.” Mais de duzentas virtudes…

 

Tratado: “Das Excellencias do Alecrim, e sua qualidade.” Mais de duzentas virtudes…



O Alecrim na história da medicina pela pena de Jeronymo Cortez, médico dos séculos XVI-XVII, da cidade de Valência. Para todos os interessados, etnobotânicos, etnofarmacólogos, ervanários, médicos e público em geral.



Notas Biográficas  sobre o médico Jeronymo Cortez:

1.      Jeronymo Cortez: desconhece-se a data exata do seu nascimento, mas pensa-se na segunda metade do século XVI, por volta de 1560, em Valência, ou numa localidade desta comunidade conhecida por Gandia. Faleceu, por certo em   1611. Foi um matemático, astrónomo, naturalista e compilador espanhol.

2.      Publicou obras que hoje podemos classificar como literatura de popularização e uso diário.  […] Também combinou previsões astrológicas com informações e sugestões pertinentes à saúde, agricultura e vida quotidiana.

3.      Obras:

1591 - Tratado del cómputo por la mano  

1594- Compendio de reglas breves

1594 – Lunário perpétuo (verdadeiro sucesso da época com milhares de exemplares impressos e em circulação)

1597 - Fisonomía natural y varios secretos de naturaleza  ( a nossa obra, publicada em 1792 em Portugal, mas pensamos que teve edições anteriores a esta data)  

1603- Aritmética práctica

1613 - Libro y tratado de los animales terrestres y volátiles. (publicado postumamente)

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Esta transcrição e a atualização da grafia correspondente aos nossos tempos, foi realizada a partir do seu “Tratado Segundo “, da sua obra da “Fysiognomia, e Vários Segredos da Natureza.” Respeita-se integralmente o texto original, apenas o trazemos para o século XXI para que todos o possamos ler  com maior facilidade e compreender melhor as suas indicações terapêuticas.

Fonte: 

Jeronymo Cortez. Fysiognomia, e vários segredos da Natureza. ( Contèm Cinco Tratados de diferentes materias, e melhorado nesta última impressão). Traduzido  para Portuguez por Antonio da Silva de Brito. LISBOA, na oficina de Francisco Borges de Sousa, Anno de MDCCXCII [1792]. Com licença Real da Meza da Commissão Geral sobre o Exame, e Censura dos Livros.

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Texto Integral do Tratado Segundo: Das Excellencias do Alecrim, e sua qualidade. PP. 14-31

“[O Alecrim de sua natureza é quente, e seco, aromático, e odorífico; e assim conforta, e recreia a todas as partes, e membros interiores e exteriores do corpo, alegra, e fortifica os sentidos, gasta as humidades, frialdades, opilações, e males contagiosos.

Finalmente, o Alecrim não admite melancolias, tristezas, tremores, nem desmaios de coração, cujas raízes, ramos, cascas, folhas, e flores tem quase infinitas virtudes das quais diremos a que bem, e fielmente coligimos, e tirámos de vários Autores; para glória de Deus nosso Senhor, e proveito dos homens.

Os gomosinhos mais tenros do Alecrim comidos pelas manhãs com pão, e sal, fortificam a cabeça, e o cérebro, conservam a vista alentada, robusta, aguda, e forte.

A flor, e folhas do Alecrim feitas em pó, e trazidas junto ao corpo, afugentam os três inimigos do mesmo corpo, que são pulgas, piolhos, e percevejos.

Os sobreditos pós trazidos junto ao corpo, e da banda esquerda, impedem a melancolia, e alegram muito o coração.

As folhas do Alecrim bem machucadas ou mastigadas, e postas sobre a chaga fresca, a curam, e cicatrizam maravilhosamente.

A flor do Alecrim comida em jejum com mel da mesma flor, e uma fatia de pão quente, conserva muito a saúde, e não deixa gerar bolhas, sangue podre, nem mal de gota, antes pelo contrário, se algum tiver tal mal, lho tirará.

O Alecrim afugenta todo o animal venenoso, cujo sumo ferve contra a peste, e mal contagioso.

Os ramos, ou troncos de Alecrim queimado, e feito em pó, aproveita para embranquecer os dentes, e fortificá-los, e não deixa criar neles bichos, nem frialdades.

A mulher que tiver uso de comer a flor do Alecrim em jejum, e com pão de centeio não padecerá malde madre, porque tomado deste modo reprime os maus humores, gasta as humidades, e cura todos e quaisquer achaques interiores a toda a pessoa, que assim o usar.

A flor, e folhas de Alecrim metidas nas arcas, e entre a roupa, a conservam sem traça, e sem se cortar, e lhe comunicam muito bom cheiro.

Quem se acostumar a lavar o corpo com água, em que se cozer o Alecrim, e tomar boa cor, saiba que se conservará com boa saúde, e disposição de moço.

As casas, que por serem escuras, e húmidas, costumam ser pouco sadias, defumando-as com o Alecrim, se conservam sadias, e enxutas.

Se quem estiver acatarrado, tomar o fumo da casca de Alecrim pelos narizes, purgará a cabeça e ficará são.

Se algum se tolher por frialdade, ou por se lhe dar o ar, estando suado, tome amiúde banho de Alecrim, e sem falta sarará.

As folhas do Alecrim pisadas, feitas em emplastro, e postas sobre as quebraduras dos meninos, são excelente cura, porque soldam, e fortificam em nove dias.

Notem um maravilhoso segredo experimentado para qualquer quebradura, e é as alfarrobas verdes pisadas, e postas sobre as quebraduras, as curam, e soldam em menos de oito dias.

A flor do Alecrim misturada com mel cozido, e escumado, feita conserva, e tomada de manhã, e á tarde, sara de todo o mal oculto, preserva de todo o achaque, que procede de fleumas, viscosidades, e frialdade.

A flor do Alecrim verde, ou seca feita em conserva com açucar, e tomada pelas manhãs com um copo de vinho branco, desterra os desmaios do coração, alarga a respiração, conforta a digestão, tira os flatos, e dor de estômago, e finalmente reprime o vómito.

As folhas do Alecrim cozidas com vinho branco, e aplicadas quentes, como emplastro, aos genitais, fazem urinar bem a quem tiver retenção de urina.

Se as mulheres tomarem por baixo o bafo de água bem cozida com o Alecrim lhes limpará a madre, confortando-a, e reparando-a para conceber.

As folhas de Alecrim cozidas em vinho branco, e postas como emplastro, o mais quente que se puder sofrer, sobre as almorreimas, apertam, enxugam, e tiram toda a dor, fazendo isto três vezes cada dia por tempo de três dias.

Quem tiver dor nas juntas por causa de algum humor frio, e as lavar a miúdo com água bem quente, em que se cozesse Alecrim, se lhe tirará a dor de qualquer parte, em que a tiver.

Se do vinho em que se cozer Alecrim, se fizer aguardente, e com ela lavarem muitas vezes a sarna, e cancro, sararão.

Quem usar de beber a sobredita água, quando se deitar na cama, será preservado de muitas doenças ocultas. E do mesmo modo aproveita para a memória.

Se lavarem as crianças com água de cozimento de Alecrim, se criarão muito limpas e sãs, sem cancro, nem sarna.

No tempo da peste é coisa muito saudável e proveitosa queimar muito Alecrim nas casas e ruas, porque adelgaça o ar, e afugenta a peste.

O mel de Alecrim, dizem os Autores, atrás alegados, que é o melhor de todos, assim para fazer pastas, e medicamentos, como para confeituras e conservas.

O mel virgem do Alecrim serve muito para tirar névoas dos olhos, e aclarar a vista, e para apurar o rosto das mulheres.

As abelhas, que fazem mel da flor do Alecrim, não adoecem tanto, como as que o fazem de outras flores.

O sumo do Alecrim, lançado dentro dos ouvidos, tira a dor que procede de frialdade, sara as chagas, gasta a putrefação e mata os bichos, que nele se criam.

O sumo do Alecrim tomado pelos narizes, tira o ruim cheiro, faz gastar o catarro, e sara o resfriamento, e chagas, e outro qualquer mal que se costume gerar dentro.

As folhas do Alecrim mastigadas, e trazidas na boca em jejum, tiram o mau cheiro, que procede dos dentes gastos, e causam hálito bom e odorífero.

O Alecrim mastigado, e trazido debaixo da língua algum tempo em jejum, costuma desimpedi-la, e tirar-lhe as fleumas quando se enrola por causa de humor fleumático.

Esta mesma virtude tem a Salva, e muito mais eficaz para falar soltamente, cujas virtudes são inumeráveis; e algumas se acharão na Agricultura de Alonso de Herrera, lib.3, cap. De la Salvia.

O Alecrim cozido em vinagre, serve para fortificar os dentes que abanam, aperta as gengivas e tira a dor, lavando-se a boca com este vinagre quente.

As folhas, e cascas do Alecrim queimadas servem para fazer purgar o corrimento dos dentes, e fortificá-los, esfregando-os com esta cinza.

Notem um admirável, e peregrino segredo, provado e experimentado da água do alecrim posta ao sol e para os olhos que têm feridas, cataratas, ou estão enevoados. Tomarão um bom molho de Alecrim verde e colhido de fresco, e pôr-se-á dentro de um urinol novo de vidro, com as pontas para baixo que não cheguem ao fundo do urinol, taparão o urinol com um pano de linho dobrado, e sobre este pano se ponha um pouco de fermento, que tome toda a boca do urinol, e em cima do fermento ponham outro pano dobrado, e o atarão muito bem, para que não possa sair bafo algum, e ponham o dito urinol ao Sol em tempo de calma três, ou quatro dias, e destilará uma água muito importante para os olhos, como fica dito. Notem porém, que depois de haver destilado a água, se há-de lançar numa redoma pequenina, a qual se trará ao Sol, e ao sereno outros tantos dias, e esta água de branca se fará amarela, e espessa, na qual se desfará um pouco de açúcar de pedra; e desta água lançarão nos olhos três pingas em cada um, pela manhã uma vez, outra ao meio dia e outro antes de se recolherem a dormir; e com o favor de Deus sararão.

Quem lavar a boca todas as manhãs com o cozimento, ou água de Alecrim a preservará de se corromper, tirar-lhe-á todo o inchaço, sarar-lhe-á as chagas da boca e das gengivas, e se tiver alguma inflamação desfará.

A mulher, que, por ter pouco leite, não pode criar os filhos, use o comer folhas e flor de alecrim, e causar-lhe-á abundância de leite bom e saudável porque purifica o sangue, e conforta a virtude digestiva.

O sumo do Alecrim misturado com açúcar, e tomado pelas manhãs, e ao deitar na cama, serve contra as ânsias, e a aflições do peito, desfaz as opilações, e sangue congelado do estômago, ajuda a digestão, mitiga a sede, e incita o apetite de comer.

O sumo de Alecrim com açúcar, tomado do modo que fica dito, resolve todo o flato, e mitiga toda a dor de estômago e ventre.

Os paus do Alecrim, e galhas finas feito tudo em pó, servem maravilhosamente para apertar a via posterior, e confortar o intestino, que sai fora por fraqueza daquela parte, pulverizando-a muito bem; e à terceira vez ficará fortalecida.

Flor, ou pós das folhas do Alecrim tomados com bom vinho, ou mel branco, mitiga a dor do braço, e do fígado, consomem o humor melancólico, que ofende o baço, e purifica o sangue, que se coze no fígado.

A flor do Alecrim fresca, cozida em bom vinho branco, e tomando alguns tragos pela manhã, desterra a melancolia, abre as entranhas, alarga o coração, assenta o estômago, conforta a digestão, tira os flatos, e impede o vómito.

O vinho bem tinto, fervido com raiz, folhas, ou flor do Alecrim, bebido tira a cólica e dor de tripas, reprime a diarreia ou o fluxo do ventre, posto que haja muito tempo que durem.

Os pós do Alecrim bebidos com vinho branco, resolvem todo o humor viscoso, e grosso, e qualquer opilação assim das veias, como do ventre, e também desfazem as pedras da bexiga deitando-as fora, e confortando aquela parte.

Quem padecer fluxo de urina, por debilitação ou fraqueza daquela parte, bebendo os pós das folhas do Alecrim, o da raiz com vinho tinto velho, reprimirá o fluxo, e fortalecerá a parte, e se continuar este remédio, sarará de todo.

As folhas, e raízes do Alecrim fervidas em vinagre servem para tirar a dor das pernas e dos pés cansados de caminhar, ou por algum humor péssimo, lavando-o com este vinagre.

Quem tiver perdido o apetite de comer, tome pelas manhãs duas, ou três sopas de vinho fervido com Alecrim; e despertar-lhe-á a vontade de comer e de dormir, confortando-lhe o estômago, e todas as partes do corpo.

Dizem Dioscorides, e Arnaldo, que o Alecrim cozido faz o mesmo efeito que a triaga, contra a peçonha. Dizem mais, que onde houver Alecrim, não se criarão animais peçonhentos, nem aranhas venenosas.

Lavando-se o rosto com água do Alecrim, com um pano de linho, o faz formoso, belo, fresco, lustroso: e se for vinho fervido com Alecrim em lugar de água, será muito melhor, em tanto, que não só causará estes efeitos senão que usando-o todos os dias, nunca se lhe engelhará o rosto, nem se lhe envelhecerá; antes o conservará fresco e belo tirando-lhe as nódoas, e mancha se as tiver.

Quem lavar, e esfregar a cabeça com água do Alecrim fervido, misturado com um pouco de vinagre, lançará fora toda a caspa, e o húmido, que ali estiver condensado, e fortificará, e avivar-lhe-á a memória.

A flor do Alecrim lançada no vinho, quando se trasfegar, o conserva, e sustenta para muitos anos, dando-lhe suave cheiro, e sabor.

O carvão da cepa do Alecrim é muito bom para os Pintores debuxarem com ele, e é melhor que qualquer outro carvão de outra espécie.

Finalmente, ao banho de Alecrim chamam os Autores alegados banhos da vida, porque tira a dor, assim das juntas, como de todas as mais partes do corpo; tira o canceroso, impede a sufocação do coração dormindo, e quando em sonhos se assusta, parece que tem sobre si algum grande peso; dá alento, e vigor à velhice, conserva a mocidade, e a renova, fortifica os membros, aviva os sentidos: e quem usar do bafo do Alecrim, tomando cada quinze dias, até o fazer suar, será preservado de todas as doenças, e renovar-se-á como a águia.

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LICOR, OU BÁLSAMO DO ALECRIM, o qual tem as mesmas virtudes, e propriedades do Bálsamo da Arábia.

Escreve Arnaldo de Villa-Nova, lugar acima citado, e o físico Macer, questão 10, cap. I, e o Doutissimo Herrera, na sua Agricultura, lib. 3, cap. 34, e outros mui graves Autores, que da flor do Alecrim se faz um licor admirável, que tem as mesmas propriedades, e virtudes do bálsamo. Dizem pois estes Autores, que se tome a flor do Alecrim estreme, limpa e bem criada, e se porá dentro de uma redoma grossa toda a quantidade de flor, que couber nela, e muito bem tapada com uma rolha de pano de linho, e um pergaminho por cima, para que não saia bafo algum e desta sorte a enterrarão em esterco, que esteja bem quente, por espaço de um mês, no fim do qual se achará toda a flor desfeita, e convertida em licor, e tirada se coará o tal licor em outra redoma pequena dobrada, espremendo bem a flor e se trará num montinho de areia, bem tapada, como de antes, ao Sol, e ao sereno, e que esteja coberta de areia até ao gargalo, por espaço de um mês, e fica feito o Bálsamo do Alecrim, do qual lançando uma pinga na água, se irá ao fundo, como se diz do Bálsamo da Arábia.

 

 

As virtudes do licor, ou Bálsamo do Alecrim

Este licor, ou Bálsamo do Alecrim tem virtude, e propriedade para sarar qualquer chaga nova, ou antiga.

Também tem propriedade este licor para igualar a carne nas feridas, fazendo que não fique sinal, ou muito pouco, como se diz do Bálsamo Arábico.

Lançando duas pingas deste licor dentro dos olhos, desfaz os nevoeiros, e cataratas, que houver neles, e conforta, e aclara a vista maravilhosamente.

Untando-se com este licor os membros enfraquecidos, e os nervos encolhidos, os desencolhe, e fortifica.

Aquieta este licor os tremores das mãos, e da cabeça, não sendo de muita velhice, e conforta admiravelmente o coração, untando-se o lado esquerdo.

Note, e advirta o curioso, que se untar o rosto com este licor uma vez cada dia, se conservará sempre fresco, e como de moço, sem já mais se lhe encrespar; e se tiver malhas, e pano no rosto, não lhe ficará sinal.

Tira este licor qualquer dor das juntas, que procede de frialdade e também atira de qualquer outra parte do corpo ainda que não proceda de frialdade.

Finalmente serve, e aproveita para os que têm cólica e para as mulheres, que padecem mal de madre, untando aquela parte, aonde se sente a dor ou ânsia, com o dito licor e para outros infinitos achaques aproveita este licor ou Bálsamo do Alecrim.

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RECEITA MEDICINAL

do Vinho mosto, e do Alecrim a qual contém muito grandes e admiráveis virtudes

O Doutíssimo Médico Arnaldo de Villa-Nova escreve um raro, e proveitoso segredo do mosto e do Alecrim cujas virtudes, e propriedades são dignas de se saberem de todos. Diz pois Arnaldo, que tomarão a flor e folhas mais tenras do Alecrim e as deitem na tinta, ou vasilha do mosto (que é o vinho que se acaba de espremer das uvas) e as deixarão estar ali até que acabe de ferver o dito mosto, e poderão usar, e servir-se dele.

E diz Arnaldo, e confessa, que um Mouro grande Filósofo, Médico e Astrónomo lhe comunicou este segredo na Cidade de Bolonha. Esta mesma receita, e segredo refere Josepho Cirurgico nos livros dos Segredos da Medicina. E dizem estes dois Autores, que se acaso se não puder haver mosto, tomem vinho tinto muito excelente, e de bom, e suave cheiro, no qual lançarão a flor e folhas mais tenras do Alecrim, e pondo este vinho ao fogo o deixarão ferver até que se gaste a terça parte de todo o vinho. E advirta que em um almude de vinho ou de mosto se podem deitar três arrates de flor, e folhas tenras do Alecrim.

As virtudes, e propriedades do mosto curtido com Alecrim

Toda a pessoa, que se acostumar a beber alguns tragos deste vinho pelas manhãs e à tarde, conservará a saúde, e renovará a disposição de mancebo. Bebido este vinho, tira toda a dor do estômago, que procede de frio, ou de cólera ou de abundância de sangue, ou de fleuma.

Serve este vinho para sarar e tirar a dor da ilharga, que procede de frialdade, ou de se congelar a pedra.

Tem virtude este vinho bebido em jejum, ou depois de jantar, para purgar o estômago e reter o vómito, e tirar a cólica num instante.

Os que perderam o apetite e vontade de comer, bebendo deste vinho, recuperam a apetência, e vontade.

O cheiro, ou fragrância deste vinho, conforta o cérebro, e recreia os sentidos, e alegra o coração.

Muitos, e grandes efeitos causa o dito vinho bebido pelas manhãs e tardes, porque fortifica todos os membros do corpo, conforta a substância, e conserva a disposição de mancebo, e retarda a velhice.

Quem se acostumar a lavar o rosto com este vinho todas as manhãs com um paninho, depois de ter lavado a cara com água fria, saiba que se lhe conservará o rosto fresco, belo, aprazível, e sem dobras nem malhas.

Lavando-se a boca com este vinho conforta, e conserva admiravelmente os dentes, fortifica as gengivas, sara as chagas, e causa todo o dia bom cheiro no bafo.

As fístulas, e chagas se curam com este vinho, lavando-as amiúde somente, e pondo-lhes em cima um pedacinho de pano de linho limpo, molhado no mesmo vinho.

Quem se sentir muito fraco e debilitado por larga doença, acostume-se a comer umas fatias de pão molhadas neste vinho, e dar-lhe-á alento em todos os membros, e grande alegria no coração e recuperará mais depressa suas forças, e vigor. Se destemperarem este vinho com água da chuva, e o usarem os tísicos, bebendo-o sararão sem falta; porque diz o Mestre Zapata no lugar citado, que ele o provou, e experimentou muitas vezes. E ainda diz mais, que tem virtude para sarar as febres contínuas. É muito a propósito este vinho para reter o fluxo do ventre ou cursos, bebendo-o.

Bebendo-se este vinho, tem virtude contra a peçonha que se bebeu ou comeu. E ainda diz o supra alegado Autor, que a sua triaga não se pode fazer perfeitamente sem este mosto ou maravilhoso vinho do Alecrim.

Serve este vinho, e aproveita muito misturado com triaga e bebido, para tirar os tremores das mãos, e cabeça: também desterra as paixões das mulheres, que procedem da madre, à qual dispõe maravilhosamente para conceber. Se os que padecem mal de gota costumarem beber deste vinho, e com ele lavarem a parte em que lhes der a gota, sararão perfeitamente. Os que padecem achaque de pedra, e costumarem criar areia, bebam deste vinho em jejum, e não só desfaz as areias, mas também causará o urinar sem impedimento e será preservativo para se não criarem mais areias, nem pedras.

Serve o mesmo vinho para desfazer toda a opilação, causa sono proporcionado; aumenta a memória e desterra a tristeza do coração.

Finalmente, bebido este vinho em jejum, e quando se forem deitar na cama leves de ceia, desopila o fígado, provoca o apetite, alegra as entranhas, conforta o cérebro, aviva os sentidos, dilata o fôlego, incita a urina, dá vigor, e força a todos os membros do corpo, ajuda admiravelmente para os velhos, aumentando-lhe o calor natural.

Advirta o Leitor, que se reparar bem, e contar as virtudes, que aqui se têm dito do Alecrim, achará que são mais de duzentas.

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Fim

 Espero que, chegados aqui, tenham tido igual prazer como me deu a mim ler, transcrever e atualizar este tratado sobre as virtudes do Alecrim…



 

Domingos Boieiro

Julho e Agosto de 2020

 

 

 

 

 

 

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