O Castelo de Marvão é um Avião


O Castelo de Marvão é um Avião

 


Marvão de Belo Efeito

Lá bem no alto sobre a montanha, a querer tocar o céu, ergue-se a vila-fortaleza de Marvão, fundada por Ibn Maruán no século IX.  Parece um avião em ascensão. Uma vista deslumbrante de cortar a respiração. Por ruas e ruelas empurramos o corpo e o olhar em direção ao castelo que chama por nós e nos convida a entrar e desfrutar da sua varanda sobre terras de Espanha, sobre a as vilas ao redor e uma porção enorme de Alentejo.



As suas portas com arcos de volta perfeita e  ogivais, com alguma gente ainda por detrás do postigo dando fé do que se passa. E por falar em fé,  entre igrejas quinhentistas, arcos e portais manuelinos, vamos olhando com atenção e descobrimos símbolos de religiosidade vária, de proteção popular, Conchas de Santiago, Hexapétalas, Volutas , e algumas Aldravas para chamar o da casa e afastar os demónios.



Marvão vale pelo todo do conjunto do património edificado, civil, religioso e militar.  Vale pela envolvente, pelas terras em redor e pelas suas gentes, pelos seus hábitos e costumes. Mas é o seu Castelo que nos merece destaque. Entrar no seu Castelo é não sair nunca mais dele.



Marvão é uma terra de belo efeito que reside para sempre em nós, pelo silêncio, pelas vistas, pelas gentes, pelo património e, ao mesmo tempo, pela resiliência que  a geologia daquele rochedo nos transmite.



Marvão  está ali no alto a guardar a fronteira e  a fazer-nos lembrar que a beleza que nos apresenta foi construída com muita dor, sofrimento e dedicação.

 


Caraterísticas Gerais

O Castelo de Marvão ergue-se sobre uma crista quartzítica, na cota de 850 metros acima do nível do mar, encerrando nos seus muros a vila medieval. Os seus muros, reforçados por torres, distribuem-se em linhas defensivas concêntricas:

a)      A linha interna, reforçada por duas torres e um cubelo, dominada pela Torre de Menagem, de planta quadrada, que lhe é adossada;



b)      A linha intermediária, coroada por ameias e reforçada por torres maciças;

c)      A linha externa, constituída pela barbacã, de onde parte a cerca da que envolve o monte e compreende a vila. A adaptação dessa defesa no final do século XVII, converteu o castelo na cidadela da fortaleza abaluartada, com Canhoneira nos eirados, permitindo o tiro rasante.[1]

 


Nota Histórico-Artística

[Marvão deve o seu nome a Ibn Marwan, figura do Islão peninsular que, pelos anos finais do século IX, aqui se fortificou em discórdia face ao califa. É precisamente desse período que data a primeira referência ao povoado, constante da crónica de al-Rázi, escrita já no século X mas que conserva parcelas dedicadas aos tempos imediatamente anteriores.


Escultura de José Cutileiro

Aí se menciona que o Monte é conhecido como Amaia de Ibn Maruán, por oposição a outra Amaia, a das ruínas, que deve ser a cidade romana com o mesmo nome, localizada no sopé do monte. Esta referência, que parece corresponder aos anos de 876-877, permite concluir que, já nessa altura, Marvão era um povoado de relevância militar, uma vez que, em outras ocasiões, Ibn Marwan ameaçou retirar-se para o Monte, numa afirmação de revolta militar contra Córdova.




Desconhecemos a marcha da história da localidade nos séculos seguintes, mas é de admitir que tenha perdido importância, dadas as condições de relativa paz no seio do Islão peninsular que, mesmo com o advento das taifas, manteve uma certa homogeneidade nesta zona, polarizada em torno de Badajoz. Admite-se que aqui se tenha implantado uma importante comunidade moçárabe mas, até ao momento, não existem suficientes provas que confirmem essa hipótese.

 Só no século XII voltamos a encontrar menções à localidade, numa altura de renovada importância estratégica enquanto ponto militar, entre o avanço do reino cristão de Portugal, a resistência das tropas islâmicas e a proximidade para com Castela. Ainda assim, não se sabe ao certo quando terá sido conquistada, variando os autores entre as datas de 1160 e 1166 .


O século XIII é mais fértil em informações e delas podemos concluir que, em 1214, pertencia à coroa nacional, aparecendo mencionada na demarcação do termo de Castelo Branco. Em 1226, terá recebido foral das mãos de D. Sancho II, não obstante alguns autores pensarem que o esforço de povoamento (na dependência das exigências militares ditadas pela proximidade da fronteira com Castela) possa recuar ao reinado de D. Afonso II. Finalmente, em 1271, D. Afonso III doou a vila a seu filho, D. Afonso Sanches, nobre que constituiu um verdadeiro senhorio fronteiriço na região e que chegou a fortificar-se contra seu meio-irmão, D. Dinis.




Só a partir da recuperação da posse da vila pelo monarca, ocorrida em 1299, se pensa que se iniciou a construção do atual castelo. O facto de encontramos aqui algumas características plenamente góticas parece vir em favor desta hipótese. Do recinto fazem parte dois níveis claramente diferenciados. O primeiro, mais pequeno e no extremo oposto ao da povoação, corresponde ao castelo propriamente dito, com uma entrada em cotovelo protegida diretamente pela poderosa e quadrangular torre de menagem, que assim se associa à defesa ativa do reduto, apesar da sua escassa altura, (dispondo apenas de dois pisos).



Neste nível superior, existe ainda a porta da traição, também protegida por pequeno torreão, e uma cisterna, que se admite poder ser ainda islâmica. O recinto inferior é bem mais vasto e possui um amplo espaço para aquartelamento e movimentação de tropas. Aqui, o elemento mais significativo é o complexo sistema de entrada, com tripla porta protegida por outros tantos adarves e por várias torres.




O sistema medieval da fortaleza manteve-se genericamente até ao século XVII, altura em que Marvão viu reforçada a sua importância no quadro das Guerras da Restauração. Sob o impulso do abade D. João Dama, reformulou-se parcialmente o dispositivo, com baluartes estrelados a proteger as principais portas e o extremo da fortaleza. Nessa altura, porém, Marvão possuía apenas 400 habitantes e a relevância da vila não se podia já comparar a Castelo de Vide, onde se concentraram os principais esforços de defesa contra Espanha][2].



Marvão no Coração

Aqui encostadinha à fronteira, esta terra a olhar lá para baixo para o Rio Sever conquista imediatamente o nosso coração pela singularidade da organização do casario encosta acima. Disposto assim, de modo espetacular, quando anoitece parece suspenso no ar, e com as suas luzes a brilhar faz lembrar uma nave espacial da guerra das estrelas ou um pirilampo que sofre de gigantismo.



Nos seus castanheiros, nas suas pedras, nas suas giestas e rosmaninhos desta paisagem natural somos aprisionados pelas artes do encantamento e da magia. A sucessão de montes ao longe, da meseta ibérica, parecem bossas de camelos em movimento sem direção ou destino certo.

Por tudo isto Marvão é também um lugar que passa a residir para sempre dentro de nós.



 

 Domingos Boieiro

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